Manifesto — Pontos de partida e de chegada
As artes tradicionais são contemporâneas.
Os objectos e utensílios criados a partir do conhecimento vernacular, replicando modelos ancestrais e criando novos modelos, não pertencem a um passado saudosista nem são curiosidades castiças. Estes objectos e utensílios resultam de um trabalho do presente sustentável, que ombreia com a alta tecnologia e contribui para a resposta aos desafios do nosso tempo e para as discussões sobre o futuro.
O produto artesanal é belo porque é útil.
Os motivos e padrões decorativos estão ligados à utilidade prática. O objecto artesanal acrescenta significado aos gestos de quem o manuseia, completando esses gestos com a sua qualidade ancestral. A cultura material do quotidiano é aprimorada num processo de uso e de consumo assente no respeito pelo meio ambiente, na simplicidade, no conforto e na beleza natural.
O saber-fazer vernacular é relevante para a cultura.
Os modos de fazer validados pelo tempo e pelo uso contrariam os automatismos da produção industrial. Os produtos de origem local apresentam soluções originais e códigos visuais que nos libertam da estética uniformizada das tendências globais. A tradição dos ofícios, assente na repetição e na permanência, acolhe os mecanismos de inovação necessários para continuar a desenvolver o panorama cultural enquanto responde às necessidades práticas.
As práticas situadas reequilibram a relação entre território, clima e identidade.
Recorrendo sobretudo a trabalho manual e materiais naturais, a produção artesanal acompanha os ciclos biológicos da natureza e contribui para a relação equilibrada entre actividade humana e paisagem. Trata-se de um modo de produção articulado com as características geográficas locais, em harmonia com a envolvência natural e o clima, e com respeito pela dignidade do trabalho.
A produção artesanal é uma actividade crítica.
Continuar a aplicar técnicas ancestrais e a reproduzir formas é uma contribuição concreta para um futuro de consumo justo e responsável. O modo de fazer artesanal e os novos produtos que dele surgem fomentam e amplificam a abordagem crítica à cultura material e aos valores da contemporaneidade. Desta forma é replicado o confronto entre o vagar dos processos biológicos e a velocidade intrínseca dos mercados, um confronto que é palpável na nossa vida quotidiana. As artes tradicionais são, por isso, essenciais quer para o funcionamento das economias locais e circulares, quer para uma discussão global sobre sustentabilidade, consumo e bem-estar.