Desenvolvimento integrado da cultura artesanal no Algarve.
Longe das vias panorâmicas e promessas de areia cálida, a gestação deste projeto representou doze meses de Algarve profundo, circunscrito entre o mar e as serras, isolados do resto: uma região singular, com raízes culturais tão profundas quanto dispersas, que se caracteriza pelo pragmatismo dos seus habitantes. Na serra vive-se longe do luxuoso paraíso turístico, pleno de sol, praia e golfe — tão longe que quando lá vão, os serrenhos têm por hábito dizer que vão ao Algarve.
Este isolamento geográfico, mas também cultural e tantas vezes político, conserva a genuinidade que inspirou a elaboração do Projeto TASA, principalmente na medida em que optámos por trabalhar apenas com o que tínhamos à mão: materiais, tecnologias, competências. Também porque acreditamos que só assim é possível chegar a criar artefactos — e não só — que resumam a expressão dos modos de fazer e pensar de um lugar e de uma gente. Objetos que tenham um sentido nas suas vivências próprias, mas que vão além do que foi feito até ao momento, lançando novas perspetivas de interpretação e de continuidade da cultura material destes lugares, sobretudo face à sua pertinência num contexto mais alargado.
Nesta região, vive-se com e da terra, daquilo que, pródiga ou austera, oferece às mãos e bocas das gentes que aqui vivem, com os pés firmemente plantados no chão, valendo-se a si próprias e suprimindo as suas necessidades com o que há e como se sabe.
Este realismo material, sem queixas nem desculpas, traduz-se numa consciência prática e aprofundada dos materiais e seu potencial, revelados em práticas ancestrais porque eficazes, mas nem por isso presas num tempo ou votadas a um espaço definido.
O projeto começou por colocar questões simples, mas de modo frontal e pragmático: Quais os problemas da produção artesanal regional? Como potenciar o mercado local através destas atividades? Como podem as artes tradicionais responder diretamente à procura atual? De que forma se podem assumir como alternativa ao produto industrial massificado?
Se há inovação neste projeto, encontra-se exatamente no partir de situações e problemáticas da realidade local — identificadas no terreno — para, através dos meios disponíveis, dar respostas concretas e diferenciadas sob a forma de atividades, produtos e serviços. O que acabámos por verificar no processo foi a capacidade dos mecanismos e estratégias adotados para uma intervenção revitalizadora num contexto onde, a par dos problemas a resolver, existem igualmente enormes potencialidades por explorar.
Trabalhar como designer a desenvolver produtos a partir de técnicas artesanais que vêm originando bens utilitários do quotidiano desde sempre, significa, antes de mais, entender os modos próprios de um contexto cultural específico — uma mentalidade e uma forma de atribuir significado.
Este é um trabalho feito longe da secretária e do computador, onde o design é uma prática — um processo de aprendizagem e produção constantes.
Mas é também um processo transparente e aberto, que ganha significado com o desenrolar dos acontecimentos, que aprende com a imprevisibilidade, que mistura diversidade num todo com sentido, e que devolve constantemente os resultados à sua origem. É preciso estar disponível e atento para acompanhar o fluxo livre das experiências sociais, a sazonalidade dos materiais e a precariedade de cada decisão. Aqui, a experiência ensina, os fazeres aprendem-se, o objeto surge da necessidade e do engenho.
O método que se desenha a partir destas premissas acaba por responder às características do lugar e, acima de tudo, por evoluir com as pessoas. O trabalho do designer é aqui, tanto ou mais que em qualquer outro contexto projetual, o de uma leitura social e humana, de interpretação cultural, de mediação entre registos: passado e futuro, manualidade e tecnologia, objeto e símbolo, função e significação.
Durante o projeto ficou claro que a solução não pode estar somente na roda do oleiro, na pesquisa do investigador ou no rótulo do produto. Tinha portanto de ser uma ação conjunta e articulada entre artesãos, investigadores, entidades locais, procura e oferta, conceção e comunicação — não há inovação sem colaboração. Os resultados atingidos só foram possíveis porque se estabeleceu, de início, uma relação de trabalho horizontal — de respeito e proximidade, de compromisso, mas também de abertura e de diálogo. Desta forma, os artesãos apropriaram-se do processo e reconheceram-se no trabalho desenvolvido, ganhando responsabilidade sobre o mesmo.
Se o papel do design aqui é o de aportar mais-valia a novos produtos, fê-lo procurando atribuir uma qualidade — material, social e cultural — específica, na forma como estes são produzidos, comercializados e utilizados. Sem deixar de parte o que estas características contribuem para o reconhecimento do património local e do trabalho manual.
Trata-se no fundo de procurar afirmar a identidade própria de um conjunto de atividades artesanais, inerentes a um território, no sentido de construir a valorização da diferença — novos artefactos com descendência e origem.